quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

FILME ESTAMIRA: UMA EXPERIÊNCIA DE TRABALHO NA DISCIPLINA DE FILOSOFIA

NO PROJETO CINEMA E FILOSOFIA O FILME EXPOSTO, NO 4º BIMESTRE, FOI "ESTAMIRA". (Subprojeto Filosofia 1 do PIBID de Filosofia/UFPR no Colégio Estadual Santa Cândida)

As reflexões da Equipe PIBID de Filosofia, composta por acadêmicos de Filosfia, professor do Ensino Médio e Professor de Filosofia no Ensino Superior, compreende que na formação de professores de filosofia existe uma dificuldade específica, ela pode ser apresentada do seguinte modo: Como devidamente exercer filosofia no ambiente escolar levando em consideração que a prática filosófica vai de encontro com o ensino de um conhecimento técnico e programático? Partindo desse problema inicial, entendemos que a estrutura e a metodologia da Filosofia no Ensino Médio, por exemplo, apenas nos deixa evidente as dificuldades. 

Se a filosofia pressupõe um processo de reflexão e diálogo, como deveríamos estabelecer essa prática em um ambiente que faz limitações ao diálogo com os alunos por meio de aulas expositivas em que a fala dominante é a do professor?  Percebemos um contraste entre a filosofia e a educação escolar no ensino médio. Entendermos que a filosofia, por meio de um processo reflexivo, deve buscar por fundamentos, ou seja, deve buscar por aquilo que é inteligível frente às coisas que vêm de encontro na experiência humana. 

A respeito da educação no ensino médio, compreendemos que o conteúdo apresentado aos alunos pode ser definido como um conteúdo técnico, ou seja, conteúdos que por si mesmos não são capazes de apresentar seus fundamentos, pois, esse conhecimento científico, é um conjunto de representações reproduzidas por alunos e professores, sendo possível concebê-las como "representações vazias". Por que denominamos tal conteúdo como "representações vazias"? Porque o que é apresentado aos alunos trata-se da representação de algo que não está dado. O assunto da filosofia é justamente buscar aquilo que pode dar-se a si mesmo (Selbstgegebenheit), o que está imediatamente dado.

Frente a essas dificuldades, o projeto Filosofia 1, do PIBID, tem consciência de que seu objetivo é exatamente fazer um esforço contra as dificuldades que se apresentam e ir contra qualquer posicionamento que indique para a impossibilidade de conciliar a Filosofia e seu ensino no Ensino Médio, pois esse seria um posicionamento contraditório com a própria existência do PIBID de filosofia. 

Neste sentido, o debate em torno do Filme Estamira, com alunos do Ensino Médio, possibilitou a realização daquilo que se compreende como a razão da existência da Filosofia como disciplina no Ensino Médio.

Os integrantes dessa atividade acompanharam com mais precisão, ao longo do semestre, duas turmas do Ensino Médio, sendo uma do terceiro ano e a outro do primeiro ano. A partir desse acompanhamento tanto as turmas quanto os integrantes do PIBID puderam desenvolver uma relação de familiarização. Sendo assim, foi possível compreender as dinâmicas específicas de cada turma, nos deixando evidente suas formas de comportamento. As duas turmas observadas foram escolhidas para participar da primeira etapa do último Cine Debate. 

O filme escolhido foi o documentário Estamira (lançado em 2006), escrito e dirigido por Marcos Prado. Por que o filme escolhido foi Estamira? O documentário acompanha a vida de Estamira, uma mulher de 63 anos que trabalhou por mais de 20 anos em um lixão do Rio de Janeiro. Ao longo do filme, mostra-se evidente que Estamira tem um posicionamento filosófico frente a vida e como tal posicionamento pode ser trazido para um diálogo com os ideais do projeto. Algum dos apontamentos feitos pela protagonista do filme/documentário Estamira,  a respeito da educação.  Como, por exemplo,  de que a escola se tornou um espaço para a produção da mera cópia do que está escrito nos livros, cópia exercida não apenas pelos alunos, mas, também, pelos professores. Interpretamos, a partir de um estudo feito sobre o filme, que Estamira está se referindo exatamente ao fato de que a escola é um ambiente que apenas reproduz algo que está totalmente afastado da realidade, tanto dos professores quanto dos alunos, ou seja, repetem informações sobre algo que sequer entendem ou conseguem ter alguma forma contato concreto que vá além de uma linguagem técnica e sem fundamentos. 

Neste sentido, a personagem Estamira lança a questão do cientificismo dominante como nocivo à vida, ao nos afastar da possibilidade de compreender nossa existência e posicionamento frente ao que acontece e de nos iludir a respeito da verdade, pois deixamos de acreditar naquilo em que vivemos e passamos a ter mais apreço pelas coisas que não estão presentes. 

Como relacionamos isso com a Filosofia? Para a fenomenologia, como método propriamente filosófico, o assunto da filosofia é sobre aquilo que está imediatamente dado por si mesmo. 

Noções como a de mundo, sujeito, coisa em si, são noções transcendentais e falar sobre aquilo que não está intuído é uma característica comum das ciências naturais, assumir uma atitude filosófica é exatamente reduzir essas transcendências e preconceitos naturais buscando um posicionamento abordando somente aquilo que está evidente e intuído.

A partir dessas considerações, e muitos outros posicionamentos de Estamira, nosso objetivo foi o de desenvolver um diálogo com os alunos, com a intenção de compreender em conjunto o sentido da fala de Estamira. Nossa intenção foi de evitar qualquer tipo de aula expositiva e transmissão de conteúdo, mas apenas buscar um fio condutor que direcionasse tanto os alunos do colégio quanto os integrantes do PIBID para uma reflexão a respeito do nosso cotidiano, como a escola.

Antes de o filme ser apresentado, fizemos uma breve introdução apontando alguns pontos das falas de Estamira que julgávamos ricos para a discussão que seria feita na semana seguinte como : o "trocadilho", os "copiadores", o homem enquanto "único condicional", o "além dos além", o "controle remoto", entre outros. Também apontamos a dificuldade de se interpretar as falas da protagonista, dificuldade esta que se apresenta em qualquer contato com qualquer alteridade, mas que fica mais explicito no trato com o não familiar, o que no fundo é o esforço de toda a filosofia, na medida em que entendemos o familiar como as opiniões aceitas passivamente. 

Na semana seguinte, após ambas as turmas terem assistido ao filme, retornamos à escola e conversamos com as turmas tendo o filme como ponto de partida, sem que ele fosse nosso fim propriamente dito. 

Inicialmente, começamos a conversa com os alunos fazendo uma retomada dos apontamentos que haviam sido feitos no encontro da semana anterior, a partir disso, tentamos recolher todas as interpretações que os alunos fizeram a respeito de certos “conceitos”. Após recolher as interpretações, que foram bem diversas, passamos a tentar direcionar os alunos pelos posicionamentos que tivemos a respeito das falas do filme, houveram dificuldades e certos embates de opiniões. Os temas principais foram: Deus; ciência; escola; religião; filosofia; sociedade. 

Nossa intenção era antes a de conduzir uma conversa tendendo, sempre que possível, para assuntos filosóficos, tendo em vista que estes estão mais presentes no diálogo mesmo do que no “resultado” da conversa. Neste sentido, poder-se-ia  dizer que o conteúdo teórico deveria antes ser fornecido pelos próprios alunos, na proporção que estes se vissem concernidos pelas questões que surgissem, para então serem desenvolvidos. Nosso autor de referência foi Friedrich Nietzsche e  a obra "Assim falou Zaratustra".

RESULTADOS:

 Nesse primeiro contato com os alunos pudemos reconhecer alguns pontos que já havíamos previsto. Como esperado, apenas uma pequena parcela demonstrou um interesse maior em participar da conversa e uma parte  destes estava realmente engajada em tratar dos assuntos para os quais tendíamos. Que alguns comentários, senão a maioria deles, fugissem do nosso objetivo não nos foi de todo inútil. Eles serviram para representar as perspectivas que compunham a opinião dos alunos. Tornou-se claro o desafio de nossa tarefa, uma vez que os alunos oscilavam entre discursos, ora sociológicos, ora psicológicos, desafiando-nos para a perspectiva que almejávamos representar: a filosófica. 

Visto desse ângulo, foi possível concluir que os alunos de Ensino Médio estão dispostos a falar quando existem pessoas dispostas a ouvi-los e não apenas ouvi-los, mas, também, buscar compreendê-los.

A experiência de debate com o Filme Estamira, possibilitou a percepção de que os alunos do Ensino Médio são plenamente capazes de exercer um processo reflexivo independentemente do assunto em questão.


(Equipe PIBID Filosofia, redação Bruno e Pedro)






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